Por Eleni Mitsou, Grécia. Tradução por Marcio Musse
Os resultados das eleições de 21 de maio naturalmente desapontaram os ativistas lutadores e o movimento de massas. A Nova Democracia (ND) venceu, conseguindo manter as suas forças (com um ligeiro aumento de 0,9%) apesar de dezenas de escândalos, ataques, repressão aguda, o crime ferroviário em Tempi1, etc.
Mais importante, no entanto, é a grande margem entre o voto do ND e todos os outros partidos, com 20% de vantagem sobre o SYRIZA. É a maior margem entre os dois principais partidos desde 1974, quando o ND estava 35 pontos percentuais à frente do “União de Centro” (o partido de centro na época). Essa enorme margem permitirá ao novo governo intensificar seus ataques à classe trabalhadora e à juventude.
Colapso do SYRIZA
O SYRIZA sofreu um grande desastre. Perdeu 11,5 pontos percentuais e quase 600 mil votos em relação às eleições de 2019, seguindo o mesmo rumo da maioria das antigas “novas formações de esquerda” e partidos social-democratas da Europa que viraram à direita e se integraram ao sistema.
Nos últimos quatro anos, o SYRIZA não se envolveu em nenhum tipo de oposição substancial. Não se concentrou em nenhum dos problemas que preocupavam as classes trabalhadoras e populares, como o colapso do Sistema Nacional de Saúde, salários, direitos dos trabalhadores, etc.
Na verdade, seria surpreendente se o fizesse, pois não tinha intenção de seguir uma política fundamentalmente diferente da Nova Democracia nesses terrenos. O SYRIZA apostou nos desgastes “naturais” do ND e nas “rinhas de galos” dos debates de TV. O resultado foi que não conseguiu atrair nem mesmo um voto de protesto suficiente – do tipo “mal menor” – e perdeu eleitores em todas as direções. Como resultado, uma parte significativa dos eleitores do SYRIZA voltou ao PASOK (o tradicional partido social-democrata) que teve um aumento de 3,5% e ficou em segundo lugar em 6 círculos eleitorais.
Derrota da esquerda e dos movimentos
Este resultado eleitoral é uma derrota para a esquerda como um todo – obviamente não incluindo o SYRIZA na esquerda. O aumento de 1,9% do Partido Comunista da Grécia (KKE) não muda, infelizmente, o quadro geral.
Com 7,2%, o KKE voltou aos percentuais que obtinha antes da crise dos anos 2008 a 2010. Ainda fica aquém, porém, do resultado de 8,4% e dos cerca de 600 mil votos das eleições de 2012.
A ascensão do KKE se deve em grande parte ao fato de ter conseguido atrair parte do voto de protesto da esquerda. Mas muitos desses eleitores criticam profundamente as políticas do KKE. O KKE pontuou melhor em grande parte devido à situação dramática do resto da esquerda e à falta de uma alternativa credível. Simplificando, muitas pessoas votaram no KKE porque não tinham ninguém mais em que votar, não porque são inspiradas por sua visão política ou porque acreditam que ele pode levar o movimento dos trabalhadores a vitórias substanciais.
A ascensão do KKE poderia ter tornado o movimento de massas otimista sobre o futuro, se fosse combinado com uma abordagem de frente única para o resto da esquerda e dos movimentos – mas não é.
Pois tal mudança poderia de fato levar a lutas vitoriosas, como foi o caso dos entregadores de aplicativos2 e outros, onde o KKE atuou em cooperação com outras forças de esquerda. Mas esses casos infelizmente foram a exceção e não a regra. É mais provável que o aumento dos votos do KKE e o fato de ser agora o único partido de esquerda no parlamento alimentem sua arrogância e atitude agressiva em relação a outras forças de esquerda e aos movimentos.
ANTARSYA
ANTARSYA (a aliança anticapitalista entre o NAR, uma ruptura mais antiga do KKE, o SWP grego e várias outras forças menores) não conseguiu alcançar mais de 0,5% (31.000 votos) e isso, infelizmente, era algo esperado. Sua votação é ainda menor do que os resultados obtidos em um passado relativamente recente – por exemplo, em setembro de 2015, quando obteve 0,85% e 46.000 votos.
O encolhimento da influência política do ANTARSYA tem sido mais do que evidente nos últimos anos. A principal responsabilidade por isso, no entanto, é de sua própria direção. Entre outras coisas, em sua recusa obsessiva em cooperar com setores da esquerda com os quais tem divergências.
MERA25
O MERA25 (DiEM25 de Varoufakis na Grécia), em vez de aumentar seu percental, perdeu cerca de 40.000 votos e ficou de fora do Parlamento, pois não atingiu a cláusula dos 3%. Teve uma pontuação ainda mais baixa do que o Partido do Curso de Liberdade (o partido do ex-presidente do Parlamento sob o SYRIZA, Zoi Konstantopoulou), que apareceu “do nada” para ficar um pouco aquém de chegar nos 3%.
A virada à esquerda do MERA25 em seu último congresso criou expectativas em setores da esquerda. No entanto, tanto a substância de seu programa quanto os conceitos usados para descrevê-lo permaneceram confusos para as camadas populares. Conceitos como “pós-capitalismo” foram por vezes identificados com o socialismo e por vezes com as políticas verde-keynesianas, enquanto o “tecno-feudalismo” como uma descrição da fase atual do capitalismo só poderia causar confusão.
Mais importante, porém, o MERA25 não parou, até o último momento, de ter os pés em dois barcos quanto à questão de um possível governo de coalizão com o SYRIZA. Falando ao público de esquerda, o MERA25 garantiu que não iria adiante com uma coalizão com o SYRIZA. Mas falando aos eleitores do SYRIZA, enfatizou que o MERA25 queria uma coalizão, mas que a direção do SYRIZA não respondeu. Varoufakis não abandonou essa posição nem mesmo em sua declaração na noite dos resultados das eleições, quando disse que a responsabilidade pela vitória de Mitsotakis é de Tsipras, que não respondeu por dois anos aos apelos feitos pelo MERA25 para discussão programática e cooperação.
A extrema direita
Antes das eleições, o ND usou a decisão do tribunal contra o Aurora Dourada3, descrevendo-o como uma “organização criminosa” para aprovar uma lei que proibia a candidatura de vários partidos de extrema-direita. Isso foi ratificado pela Suprema Corte e, portanto, Aurora Dourada e várias de suas divisões não puderam apresentar seus candidatos nas urnas. Isso permitiu ao ND limitar a perda de votos à direita. Mas é claro que varreu a extrema-direita do mapa.
A pequena mas significativa subida da “Solução Grega”, que obteve 4,5% e o aparecimento, do nada, de outro partido de extrema-direita, o “Vitória” (“Niki”), que não conseguiu entrar no parlamento por uma pequena margem de votos, mostra que a presença da extrema-direita na cena política central veio para ficar.
Novas formações políticas nascerão constantemente para representar este espaço, enquanto permanecerem as causas profundas que levam as pessoas à xenofobia e ao nacionalismo. Dependendo do período e da resistência do movimento antifascista, esses partidos podem ter características mais moderadas, como hoje; mas é perfeitamente possível que no futuro sejamos confrontados novamente com gangues neonazistas mais violentas nas ruas, em uma escala muito maior do que hoje. Enquanto amplos setores da sociedade grega estiverem atolados na pobreza e na opressão, a extrema direita e o neofascismo encontrarão espaço para crescer; é por isso que a luta antifascista deve continuar.
Olhando para frente
A esquerda e os movimentos ainda operam no ambiente da derrota causada pela capitulação do SYRIZA em 2015. Embora passos importantes estejam sendo dados em certas áreas e campos de resistência, embora o movimento comece a aparecer mais forte nas ruas, falta a organização política e a representação que lhe permitirão lutar e obter vitórias.
As forças que lutam pela derrubada do capitalismo e pela construção de uma sociedade socialista em condições de democracia operária, que são bastante substanciais na Grécia, têm o dever de trabalhar juntas com o objetivo de lançar as bases para um novo partido de massas dos trabalhadores e juventude.
Em nossa opinião, as organizações de esquerda anticapitalista que se orientam para os movimentos de massas e para a classe trabalhadora e entendem a importância da abordagem da Frente Única, precisam caminhar na direção de uma formação política comum baseada em:
- Um claro programa anticapitalista/socialista,
- Intervenção em todas as lutas, no combate pelas necessidades e demandas diárias das massas trabalhadoras, ao lado da luta geral anticapitalista,
- Colaboração na base da paridade entre as diferentes organizações, com respeito e representação adequada para os militantes não alinhados a nenhuma delas,
- Uma abordagem de frente única para outros setores da esquerda; para ações conjuntas, iniciativas conjuntas em movimentos, manifestações, etc., apesar das diferenças ideológicas que possam existir.
A nosso ver, as condições para tal iniciativa estão maduras entre várias organizações – aquelas que durante esta campanha eleitoral não se identificaram com uma determinada formação eleitoral de esquerda, mas assumiram a posição de votar nos partidos de esquerda sem manifestar voto de preferência para qualquer um deles. Ao mesmo tempo, é claro, tal iniciativa deve estar aberta a qualquer outra força que queira participar e contribuir.
Artigo originalmente publicado em Internationalist Standpoint
Esta é uma tradução editada de um artigo do “Xekinima”, publicado originalmente no dia 22 de maio em grego. Para o histórico do resultado desta eleição, você pode ler nossa análise pré-eleitoral aqui, nossa posição perante a eleição aqui e nossa contribuição para os debates ocorridos na Esquerda grega aqui. Você também pode encontrar mais informações em nosso artigo de atualizações ao vivo aqui.